Uma linda mulher, montando um cavalo,
entra na pequena cidade de madeira. Ela mede 1,74mt, boca sensual, olhos azuis
cintilantes e profundos – duros ao fitar seus inimigos. Cabelos louros, em
desalinhos, soltos ao vento. Está cansada, mas, seu trajeto é decisivo. Nada
impede de entrar naquele miserável, esquecido e poeirento lugarejo de escaldante
sol.
Charlie Moonlight, um velho negro de visível
aparência cansada, vestindo surrado terno marrom, chapéu coco na cabeça, acompanha
o cavalgar da jovem e a saúda gritando:
- “Um metro e setenta e seis! Sim, um
metro e setenta e seis! Eu nunca me engano”!
Ela responde fuzilando-o com um olhar
de desprezo. Coveiro é maldito no Oeste americano. É um mau agouro para
pistoleiros. Ela segue em frente seu caminho e ele voltar a trabalhar em um
caixão. A experiência daquele homem o faz “medir” as pessoas com um simples
olhar. A amazona é Sharon Stone. O agente funerário é Woody Strode. E este será
seu último filme: “Rápida e Mortal” (The Quick and the Dead/1995), de Sam Raimi
- nos créditos finais, seu nome aparece recebendo uma justíssima homenagem, do
diretor, que lhe dedica o filme.

Quando ainda não havia “cotas” para negros no cinema americano, Woodrow
Wilson Woolvine Strode já brilhava na tela grande. Por talento! Nasceu na
cidade de Los Angeles - Califórnia - a 25 de julho de 1914. Ou seja: teria
feito 100 anos, se vivo fosse. Foi uma estrela de futebol americano da UCLA – University of
California, Los Angeles. O cineasta John Ford (1894-1973) o levou para fazer
uma ponta, sem crédito, no seu clássico “No Tempo das Diligências (Stagecoach/1939).
Em seguida o jovem trabalhou com o diretor Henry Hathaway
(1898–1985) no filme “Quando Morre o Dia” (/1941).
Devido seu porte atlético – e também lutador – fez vários filmes onde aparecia
trocando socos. Os mais famosos são “Demetrius e os Gladiadores” (D/1954, de Delmer Daves, 1904–1977), e “Spartacus” (idem/1960), de Stanley Kubrick (1928–1999). Foi ele quem desafiou Kirk
Douglas numa arena (a curiosidade fica por conta de uma de suas falas:
“Gladiadores não fazem amigos.” Genial!). Também atuou em filmes ambientados na
África Negra e filmes de piratas. Fez vários filmes faroestes (tanto americanos
como produções italianas deste tema). No filme “Os Dez Mandamentos” (/1956, de Cecil
B. DeMille, 1881–1959), fez um príncipe etíope vencido por Moisés (Charlton Heston, 1923–2008).
Ainda em 1960 o mestre John Ford o escalou para ser um dos
protagonistas do filme “Audazes e Malditos” (). A história se passa em um forte militar, no Arizona, onde Strode
fez o papel - sargento do Batalhão Negro
(conhecidos como os “Soldados Búfalos”). Na caserna vive uma adolescente, filha
do comandante. São amigos. Os brancos do forte não aprovam e hostilizam aquela
amizade. Uma noite a mocinha sofre um estupro e em seguida, assassinada. Por sua
cor, e algumas atitudes suspeitas, todos acreditam ser ele o culpado pelo crime.
O tema é extremamente delicado e polêmico. Numa época em que os estados do Sul
dos Estados Unidos estão vivendo em conflito com a comunidade negra daquele
país. Mas Ford é Ford e, com sua habilidade e maestria, o filme é um sucesso. Strode
dá um banho de interpretação.
Depois disso o ator fez grandes filmes. Dentre eles, clássicos
como “Os Profissionais” (The Professionals/1966, de Richard Brooks, 1912–1992),
“Era Uma Vez No Oeste” (C'era una volta il West/1969, de Sergio Leone,
1929–1989), “A Crista do Diabo” (The Deserter/1971, de Niksa Fulgosi, 1919–1996
e Burt Kennedy, 1922–2001), “Keoma (idem/1976, de Enzo G. Castellari), entre
outros. Nestes filmes Strode foi cowboys, gladiadores, policiais, soldados, piratas,
nativo africano. Também fez papel de índio em “Terra Bruta” (Two Rode
Together/1961, de John Ford), e Shalako (idem/1968, de Edward Dmytryk,
1908–1999). Foi um guerreiro mongol em “Gengis Khan” (Genghis Khan/1965, de
Henry Levin, 1909–1980), e um bandoleiro chinês em “Sete Mulheres” (7 Women/1966, de
John Ford).
Com John Wayne (1907-1979) Woody Strode trabalhou em apenas um
filme: “O Homem que Matou o Facínora” (The Man Who Shot Liberty Valance/1962,
de John Ford). Onde fez o papel de “Pompey” - leal auxiliar de Tom Doniphon
(Wayne). Ford também lhe deu uma fala emblemática: numa aula sobre democracia responde
ao professor, Ranson Stoddard (James Stewart, 1908–1997), sobre igualdade,
direitos e deveres. Linda a cena!
Além de atleta, também era exímio atirador de arco e flecha – e
este talento, a parte, lhe foi explorado em vários filmes. Em 1993, antes de
fechar sua filmografia de 93 filmes – entre 1939 e 1995 -, com alguns trabalhos
para séries de TV: Mandrake, O Mágico, Daniel Boon, Batman, Tarzan, entre
outras séries, Woody Strode fez o curioso “Posse” (idem, de Mario Van Peebles),
que conta a estória de cowboys negros. Aliás, ele é quem faz, em flashback, a
narração do filme.
O grande ator negro faleceu, aos 80 anos, no dia 31 de dezembro de
1994, em Glendora, Califórnia. E muitos se lembraram de que foi ele quem, em
1973, durante o enterro do mestre John Ford, fez a celebre sugestão: “O mestre
deveria ser enterrado em Monument Valley”... - fcésar
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